segunda-feira, julho 28, 2003

A classe política

Há uns anos atrás ouvi, perplexo, o Dr. Mota Amaral, que então já não era presidente do Governo Regional dos Açores, declarar numa entrevista que, até ser confrontado com um caso familiar próximo, não se tinha apercebido da dimensão do problema da droga na sociedade portuguesa.
O Dr. Mota Amaral era, à data, e é ainda hoje, um daqueles políticos que respeito.
Há uns anos atrás, menos, acompanhei, ainda mais perplexo, as reflexões do Dr. Almeida Santos sobre o problema da droga, ao que julgo saber também com base num caso familiar próximo.
O Dr. Almeida Santos é um daqueles políticos cuja voz tenho aprendido a respeitar.
Estes homens, que nos surgem como sendo, de certa forma, a elite da classe política (até pelos cargos que posteriormente ocuparam, sinal de claro reconhecimento pelos seus pares) estiveram durante muito tempo da sua acção , completamente desfasados de um dos maiores problemas da sociedade que se propõem governar e não se coibiram de o revelar publicamente.
Hoje, a propósito da prisão preventiva, das escutas telefónicas e demais problemas, apercebemo-nos do distanciamento da classe política face à justiça. Como se de repente se apercebessem, com surpresa, que quase tudo está mal. Como se nunca tivessem participado na sua concretização. Como se nunca se tivessem apercebido das “penas simbólicas” para justificar o tempo já decorrido em prisão ”de facto”. Como se nunca lhes tivesse ocorrido que as escutas telefónicas são uma violação clara dos direitos, liberdades e garantias de cada um, que só deveriam ter lugar em casos, não muito, mas muitíssimo especiais e sobre apertadíssimo controle, porque são propicias a toda a espécie de facilitismos intoleráveis.
Não se trata de aqui de alterar ou não alterar legislação “a quente”. Nem de alterar porque atinge a classe política. Se está mal tem que ser alterado quanto antes, precisamente por uma questão de justiça, para todos os que se encontram em situações injustas, incluindo a classe política. Não rever a legislação para “não dar a imagem de...” está na esfera de Kubanacan, e portanto, da anedota.
Trata-se aqui de constatar, com muita preocupação, suspeitas acumuladas ao longo dos anos, de que os nossos governantes, em grande parte dos casos, não nos governam, limitam-se a ocupar este ou aquele cargo. Trata-se de perceber, que os rostos da nossa classe política, nos seus melhores casos, estão desfasados das realidades dos cidadãos. Nos outros casos, nem vale a pena aprofundar. Trata-se de concluir, que uma geração de políticos, dos vários quadrantes, passou já o seu “prazo de validade” e que é urgente a sua renovação.